Reprovar ou Oportunizar, Qual a minha responsabilidade nesse processo?

Trabalho em Educação há mais de 40 anos e ainda tenho o entusiasmo necessário aos profissionais dessa área.

Tive o privilégio de lecionar (e o verbo revela a minha idade) para todos os anos e séries da Educação Básica. De todos os segmentos, o que me deu maior prazer foi o Ensino Fundamental I pois recebemos crianças muito pequenas e lhes ensinamos o “aprender a aprender”.

Após 30 anos de trabalho em turmas, recebi o desafio de coordenar de 5º ao 8º ano. Poderia colocar em prática todos os ensinamentos que recebi de excelentes coordenadores ao longo da minha trajetória.

Durante todo esse tempo, ouço reclamações de professores insatisfeitos com o sistema de avaliação. Acreditam que mudanças nesse processo contribuirão para melhoria da educação.

Hoje, mais experiente e com mais tempo para observar, refletir, acredito que o foco deverá estar na produção de conhecimentos. Não melhoraremos o ensino sendo cada vez mais rígidos em nossas avaliações. Não estou afirmando que o processo de avaliação não seja importante, mas só teremos uma educação de sucesso quando melhorarmos nossas práticas pedagógicas com aulas mais dinâmicas, onde o aluno seja o protagonista.

Confesso que até hoje fico muito tensa nos dias de Conselho de Classe . As decisões tomadas serão soberanas. Nesse momento, nos reunimos para decidir a “ vida dos alunos” entre “passar x perder x recuperar” e isso me deixa inquieta e apreensiva.

Discutimos, refletimos sobre cada aluno e seremos nós, no final das contas, quem iremos bater o martelo.

Avaliar ou medir? Reprovar ou Aprovar ? Muita cautela nessa hora. Já ouvi professores e outros profissionais de Educação dando o veredito: “esse não tem jeito”, “não quer nada “, “merece ser reprovado”. Será que estão certos? Fico sempre me perguntando… será que esgotaram todas as possibilidades de ensinar?

Não sou contra currículos, conteúdos, mas não podemos definir o aluno simplesmente por não ter conseguido responder como seus avaliadores gostariam.

No dia do Conselho de Classe, professores, coordenadores, diretor pedagógico reunem-se para decidir sobre o futuro de cada aluno.

O que realmente importa? Decorar e responder tal qual o livro?

Nesse momento, lembrei de uma passagem de minha vida. Aos 18 anos fui trabalhar numa conceituada escola de minha cidade. Era o 1º ano dessa escola no segmento de Ensino Fundamental 1. A clientela era composta por crianças com alto poder econômico, mas muitas delas sem orientações familiares, sem organização nos estudos.

Tempos depois, em viagem de férias reencontrei um rapaz que tinha sido aluno dessa escola, administrando uma empresa de “Banana Boat”. Ele me reconheceu e, em nossa conversa, perguntei pelo seu irmão “Alexandre”. Era um aluno desengonçado, pouco aplicado mas muito carinhoso.Apresentava algumas defasagens na escrita.

Qual foi a minha surpresa!

“ Professora meu irmão nunca foi um bom aluno. Na adolescência, chegou a abandonar os estudos e foi trabalhar num hospital. Lá despertou. Resolveu fazer supletivo e tornou-se um estudioso. Hoje é um excelente cirurgião. Adora o que faz! Continua estudando muito!”

Fiquei imensamente feliz e me perguntei:

Quem o fez despertar para esse mundo? Como eu não havia percebido o grande aluno que estava escondido no “Alexandre”?

Hoje, diante de um grupo de professores, todas as vezes que temos que decidir quem será aprovado ou reprovado fico me indagando: será que esgotamos todas as possibilidades para promover a aprendizagem desse aluno?

Por Eliane Pinho Leite, professora, pedagoga formada pela PUC-RJ, trabalhou durante anos no Instituto Gay Lussac e hoje é Coordenadora do Ensino Fundamental II no Colégio Plínio Leite.