O Direito Autoral como ferramenta da educação

Por Giulia Willcox Rosa

Falar em Direitos Autorais já virou um lugar comum, um clichê da era digital. Mas por quê? Porque este ramo do Direito está tão em voga atualmente? Certamente, não é um ramo novo (sua primeira lei, pelo menos de que se têm notícias, data de 1710).

Trago aqui alguns pontos a serem considerados e que talvez expliquem a popularidade do ramo e as implicações que tem em nosso dia a dia:

As formas de uso de determinada obra, para o direito autoral, são independentes, e por isso cada uma necessita de autorização expressa do autor. Essas modalidades estão expressas exemplificativamente no artigo 29 da LDA. Ainda, o artigo 49, inciso VI, diz que os contratos que versem sobre transmissão de direitos autorais deveram ser interpretados restritivamente quando não houver especificação sobre a modalidade de utilização objeto da licença ou cessão. Tecla SAP do juridiquês para o português: Se eu sou Autora de obra literária, por exemplo, e licencio para uma editora o direito de editá-la e publicá-la por meio impresso, ela não poderá fazer um ebook da minha obra, pois não foi previsto expressamente no contrato.

Recentemente, decisão do STJ consolidou esse entendimento quando decidiu em favor de Millôr Fernandes, que entrou como uma ação em face da Editora Abril, pela publicação de seus textos e desenhos em acervo digital da Revista Veja. A 3a Turma do STJ teria entendido que o uso que a Editora Abril faz da obra de Millôr deveria estar restrito ao acordado entre as partes, ou seja, uma edição da Revista Veja, e que a colocação de seu trabalho em acervo digital da Revista extrapolaria o avençado entre as partes (que deve ser interpretado restritivamente, como já salientamos). Para saber mais: http://www.conjur.com.br/2016-ago-04/stj-condena-abril-violar-direitos-autorais-millor-fernandes

As modalidades de usos de obras, sejam elas literárias, musicais ou audiovisuais, que fazemos na internet se multiplicou. A internet abriu um mundo de possibilidades, canais de informação e comunicação, uma permanente exposição a conteúdos que certamente tem algum autor, autora ou autores por trás. E esse provavelmente é o principal motivo do direito autoral ter se tornado nos últimos anos um ramo pop do direito.

E que consequências isso tem na educação? A internet oferece inúmeras ferramentas e conteúdos para serem usados em sala de aula, mas eu posso usar todas elas livremente? Será que estou infringindo os direitos autorais de alguém?

Essa é uma preocupação que deve estar latente na cabeça de muitos educadores, coordenadores e pedagogos. Por isso, vale esclarecer alguns pontos:

Você está certíssimo(a) em se preocupar. Nem todo o conteúdo que está na internet é livre, e o fato de uma obra estar na internet não quer dizer que esteja em domínio público, embora esteja mais acessível.

Mas então eu não posso usar trechos de livros, músicas ou filmes, ou utilizar recursos como o YouTube em sala de aula?

Teoricamente, pode. Existe uma flexibilização maior do direito autoral quando o uso de determinada obra protegida é feito para fins educacionais, informativos e didáticos. Esse é um entendimento consignado por diplomas internacionais, como a Convenção de Berna (1886, e passou por diversas revisões desde então), da qual o Brasil é signatário. Por isso, diz o nosso artigo 46, que trata das exceções e limitações à proteção autoral:

“Não constitui ofensa aos direitos autorais: a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra” e “a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fins exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro”.

Essas previsões advêm de um consenso geral de que a proteção autoral não pode constituir um empecilho para a transmissão de conhecimento, para o processo educacional. O contrário seria até inconstitucional, visto que a Constituição prescreve o acesso à educação, tanto formal quanto material.

Portanto, educadores, preocupem-se, sim, com o direito autoral, mas não tanto. Disponham livremente das mídias e recursos, digitais ou não, a que tiverem acesso em sala de aula; se utilizem de músicas, livros, filmes, para tornar o aprendizado mais gostoso; sempre com bom senso e desde que o seu uso não extrapole a função a que serve: educar.

Giulia Willcox Rosa

Advogada – especializando-se em Direitos Autorais
Escritora
Desenvolve trabalhos na área de Audiovisuais