Alzira Willcox
Comecemos pela definição. O termo ética vem do Grego ethos, que significa modo de ser, conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em que vive. Portanto, a ética na Filosofia estuda os valores que regem os relacionamentos interpessoais, a convivência entre pessoas num grupo social. Ética é, pois, aquilo que pertence ao caráter. E moral é a mesma coisa?
Não. Moral tem a sua origem no Latim e vem de mores, significando costumes. Moral é, então, relacionada a regras e normas, costumes construídos em cada cultura e Ética é o modo de agir de cada um.
Moral é um conjunto de normas que regulam o comportamento do homem em sociedade. Estas normas são adquiridas pela educação, pela tradição e no cotidiano. Durkheim explicava moral como “ciência dos costumes”. E esses costumes que constituem a Moral regem as leis que têm caráter obrigatório.
A Moral surgiu nas primeiras tribos, quando o homem passou a fazer parte de agrupamentos porque ele foi instado a distinguir o bem do mal, a adquirir consciência moral no contexto em que vivia.
A ética tem sido objeto de discussão em diversos campos – filósofos, educadores, teóricos de diferentes áreas do conhecimento – ao longo dos séculos.
Mas, ultimamente, o debate tem se intensificado por vários motivos.
Comecemos destacando um, de natureza mais geral e que diz respeito às profundas transformações sofridas pela sociedade contemporânea em diferentes setores da vida humana, especialmente com o advento da internet e o surgimento das redes sociais. As redes sociais são o novo no terreno da moral e da ética. Os códigos de moral específicos da atividade no campo virtual não foram claramente estabelecidos. Vão surgindo à medida em que deslizes os impõem. E a ética, entendida como conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação ao outro, vem sendo sistematicamente abandonada pelas camadas da sociedade detentoras de suposto saber e dominando bem, também supostamente, o seu sentido e significado.
Outro motivo para debate refere-se mais especificamente à educação e o desafio de formar indivíduos, ao mesmo tempo, reflexivos e autônomos, sem que percam o sentido de solidariedade social e os laços necessários com a sociedade. Através da educação se dá o próprio processo de constituição dos humanos. E nessa perspectiva se espera que a educação formal contribua para que os homens construam suas relações apoiando-se em valores defendidos na vida social e em contextos sócio-históricos específicos. À escola cabe, então, trabalhar a sistematização do conhecimento e construção dos saberes historicamente reproduzidos, mas também promover a formação ética dos indivíduos.
E essa concepção confere outra dimensão à relação professor-aluno, a dimensão ética, o que se dá por meio de sua prática pedagógica.
E esses dois motivos já trazem uma grande amplitude para o debate sobre ética.
O significa educar? Que valores éticos devem ser defendidos em um mundo que, de repente, ficou pequeno e globalizado, considerando o avanço tecnológico e do conhecimento com suas repercussões sobre a vida das pessoas?
Quais são os valores que chegam ao mundo em poucos segundos com os avanços tecnológicos?
Ética? Não há exemplos edificantes nas esferas superiores, por parte de quem deveria ser ético pela natureza de seu trabalho ou suas funções. Ferem constantemente a ética os que governam, os que julgam, os que legislam e os cidadãos em geral.
Deixar apenas à educação e aos professores, principalmente, a tarefa de formar cidadãos éticos é conferir alta responsabilidade à educação.
Na perspectiva filosófica de Kant (1985), a autonomia dos sujeitos corresponde à conquista da sua maioridade intelectual e moral. É por meio de uma consciência autônoma, que os indivíduos sabem resolver problemas diversos, desenvolvendo uma reflexão própria. Para tanto, é preciso utilizar conhecimentos e não só informações, e apoiar-se em princípios éticos e não apenas em
vivências que, muitas vezes, podem não traduzir os valores morais do coletivo.
A ética efetivamente contribui para o convívio da pluralidade nos vários espaços públicos, dentre os quais se destaca a instituição escolar. Nesse nível de entendimento, cabe perguntar: como a educação pode contribuir, na sociedade contemporânea, para a formação ética dos indivíduos, desenvolvendo valores como, por exemplo, justiça, solidariedade e autonomia?
A resposta a essa pergunta, certamente não é fácil e rápida. Todavia, no mundo tornado pequeno, cresce substantivamente a importância e responsabilidade não só da escola, mas também dos pais na formação integral dos indivíduos em sua dimensão ética.
É preciso, sim, que os professores desenvolvam cada vez mais a própria consciência ética, estabeleçam uma relação orientada por uma ética coletiva cujas raízes se fixem na sua prática pedagógica, mas envolvam toda a escola e também os pais em seu fazer cotidiano.
Na perspectiva de uma ética coletiva, a relação professor-aluno implica conceber a educação como um processo que contribui para um duplo objetivo:
1. pensar um projeto plural de sociedade
2. refletir a respeito do ser humano e das possibilidades que ele tem para se transformar do que é para o que poderá vir a ser.
Afinal, essas são dimensões que se alimentam mutuamente, visto que homem e educação são indissociáveis.
Na discussão sobre ética há muitos caminhos, mas propusemos enfocar a educação porque, sem dúvida, a educação tem papel primordial nos rumos da sociedade.
E falar em educação, é remeter à ação docente porque:
. na dimensão cognitiva, a ação docente concorre para a construção de um processo de ensinar e aprender, visando à transmissão e assimilação de conhecimentos historicamente construídos;
. no plano social e emocional está relacionada aos vínculos afetivos que se estabelecem entre professor e alunos;
. é a combinação desses fatores, na ação do professor, que levará à formação integral do indivíduo e à possibilidade de mudanças.
A escola, na era da tecnologia e redes sociais, é ainda, junto com a família, a mais importante instituição para a formação ética do indivíduo. Mas é da escola que se espera o cumprimento de tal missão, desde a Antiguidade inscrita em seus fundamentos. Para isso é preciso que a escola seja um espaço em que haja debates, se privilegie a análise crítica sobre os acontecimentos do mundo que a rodeia e do mundo maior que envolve vários atores sociais. Um espaço em que efetivamente se respeite o outro e suas ideias, em que se estimule o pensamento democrático e, sobretudo, prime por atitudes éticas por parte de todos.
E sem que esqueçamos a valorização do professor em sua formação profissional e remuneração. Talvez, assim, a ética possa ser refundada em nosso país.