Novos tempos em educação

Alzira Willcox

 

Não é novidade para ninguém que a educação é hoje um empreendimento de alta categoria, entregue a gestores formados em administração, economia, finanças. Falo das empresas cujo produto é a educação. Escolas privadas.
Faz uns vinte anos mais ou menos que as coisas começaram a tomar outro rumo e os pedagogos deixaram de ser gestores das escolas, embora continuem a implementar o planejamento e decisões para a área pedagógica. Escola é hoje,um negócio como outro qualquer – tem clientes e vende um produto. Algumas escolas à moda antiga sobrevivem pela teimosia de alguns “velhos” educadores que já começam a perceber que precisam fazer algumas concessões ao novo.
Como em todo negócio, as escolas, algumas pertencendo a grandes grupos empresariais, inclusive internacionais, mais que nunca precisam desenvolver estratégias de marketing para captar clientes, além, claro, de trabalharem para ocupar um lugar de destaque no ranking de desempenho das escolas. Mas os clientes estão cada vez mais bem informados e exigentes. Então não basta fazer um bom trabalho, é preciso alçar voos mais ousados para transmitir velhos e necessários conteúdos usando recursos que os tornem mais atraentes. E assim surgem as inovações. E muitas ofertas de atividades que possam fazer a diferença em um mercado cada vez mais consciente e ciente do que deseja. A competição é grande e acirrada como o é em todo negócio. Natural que assim seja.
Como consequência percebe-se uma invasão de termos novos e propostas arrojadas no setor. A maioria em inglês. E-learning, play based learning, blended learning, educação maker, peer to peer, project based learning, problem based learning… O professor de hoje precisa estar atualizado, precisa de autorreciclagem, enfronhar-se em novos recursos, rever sua prática, renovar-se para não se sentir alijado da modernidade. Não se trata de modismo passageiro – a tecnologia é uma realidade e os avanços ocorrem em alta velocidade. As práticas pedagógicas têm sido revistas e repaginadas. Não há lugar para saudosismos. O bom professor terá sempre seu lugar. Mas, aqui, me refiro ao bom professor que, longe de se acomodar ou negar a importância das inovações tecnológicas que chegam à educação, assumem o seu papel, pesquisam, estudam, tornam-se aliados de tais inovações.
Vamos lá! Tentarei descrever cada uma dessas novas estratégias em educação. Assim, a conversa dos pais com o pessoal das escolas pode ficar mais clara. E os professores que ainda não conhecem podem familiarizar-se com as novas propostas. Muitas são velhas conhecidas com roupagem nova.
Segue, então, um pequeno glossário para pais e professores.
1. Geek: é uma gíria inglesa que se refere especialmente aos fãs de tecnologia e de eletrônicos.
2. E-learning: é uma modalidade de ensino à distância utilizada para definir aprendizagem por meio de mídia eletrônica.
3. Play based learning: é o aprendizado através da brincadeira, num ambiente propício à aprendizagem porque estudos apontam que as crianças aprendem conceitos e desenvolvem melhor as atividades quando o fazem através da brincadeira. A brincadeira é ligada, no processo de desenvolvimento infantil, ao cognitivo.
4. REAs: Recursos Educacionais Abertos (REAs) são materiais de pesquisa, ensino e aprendizagem oferecidos de forma gratuita no ambiente virtual. Eles incluem qualquer formato de mídia, desde textos e vídeos até jogos (games) e aplicativos.
5. Blended learning: o ensino híbrido, é a abordagem que aposta em alternar diferentes momentos de aprendizagem em torno de uma única temática. Apesar de, hoje, estar intrinsecamente relacionado ao uso de tecnologia digital, o ensino híbrido remete à reorganização do tempo e do espaço da aula, além de alternar papéis de aluno e professor. Entregar um tablet na mão de cada estudante não caracteriza o ensino híbrido: ele se concretiza quando diferentes propostas de trabalho se alternam e entrelaçam para ampliar a aprendizagem.
6. Educação maker ou aprendizagem maker: o Movimento Maker na Educação significa “colocar a mâo na massa”, fazer. Oferecer espaços diferenciados para a aprendizagem, os chamados “espaços makers”, um ambiente personalizado em que os alunos possam expressar a sua criatividade, participando de experiências e projetos transdisciplinares, construindo suas próprias criações, trabalhando a autonomia e tendo estimulado o seu protagonismo. O movimento maker atrela a cultura do “faça você mesmo” com a tecnologia. Quando aplicado ao ambiente escolar, seu objetivo é promover a criação, a investigação e a originalidade. No movimento maker, é importante pensar fora da caixa, buscar soluções criativas e saber aproveitar recursos.
7. Peer to peer: significa “de igual para igual”, em inglês e é conhecida como aprendizagem por pares. A ideia central é que o conhecimento seja construído a partir da interação entre alunos. Para trabalhar com peer to peer, o professor deve organizar a turma em pares, porém, essa organização não deve ser aleatória. Isso quer dizer que dois alunos não são agrupados por acaso; eles devem ter habilidades e conhecimentos complementares para que ensinem um ao outro. É, na prática, a aplicação do conceito de “par mais capaz”, de Vigotsky.
8. Gamificação (ou, em inglês, gamification): tornou-se uma das apostas da educação no século 21. O termo complicado significa simplesmente usar elementos dos jogos de forma a engajar os alunos para atingir um objetivo. O potencial da gamificação é imenso: ela funciona para despertar interesse, aumentar a participação, desenvolver criatividade e autonomia, promover diálogo e resolver situações-problema. Para fazer uso da gamificação não é preciso usar jogos prontos – apesar de eles serem uma das possibilidades. Jogos como Minecraft (em que os jogadores precisam encontrar recursos, construir estruturas e plantar para sobreviver) tornaram-se populares não apenas entre crianças e adolescentes.
9. O Project Based Learning (PBL): significa “aprendizagem baseada em projetos”, aposta na construção de conhecimento por meio de um trabalho longo de investigação que responda a uma pergunta complexa, problema ou desafio. A partir dessa questão inicial, os alunos se envolvem em um processo de pesquisa, elaboração de hipóteses, busca por recursos e aplicação prática da informação até chegar a uma solução ou produto final. A aprendizagem baseada em projetos torna o aprender e o fazer inseparáveis.
10. Problem Based Learning: mais uma metodologia de aprendizagem ativa com foco no estudante. A aprendizagem baseada em problemas é semelhante à aprendizagem baseada em projetos, também parte de uma pergunta desafiadora, que pode ser tanto proposta pelo professor quanto pelos alunos. Nesse último caso, é importante que o grupo se reúna para levantar aquilo que já conhece sobre o tema, o que pretendem resolver e o que precisam aprender para chegar à solução. É uma estratégia para pequenos grupos.
11. Flipped classroom ou sala de aula invertida: nesse modelo, alunos estudam os conteúdos previamente, em casa, através de materiais digitais: videoaulas, textos, podcasts, etc, o que não significa que a sala de aula fica de fora do processo. Após o estudo individual, os alunos vão para a aula para tirarem dúvidas, debaterem, trazerem assuntos complementares e desenvolverem projetos e atividades em grupo. Justamente o contrário do sistema tradicional, em que o aluno aprende primeiro em uma aula expositiva e faz a tarefa de casa, sozinho, depois. A sala de aula invertida coloca o foco no estudante, não no professor.
12. Rotação por estações de aprendizagem: é uma modalidade do ensino híbrido, já que cria um circuito dentro da sala de aula. A proposta é que os alunos, divididos em pequenos grupos, façam um rodízio por essas estações, cada uma com atividades acerca de um mesmo tema central – uma delas, no mínimo, fazendo uso de tecnologia digital. É importante ressaltar que o trabalho em cada estação seja independente das outras; ou seja, que tenha começo, meio e fim, sem exigir um exercício prévio. Isso porque cada grupo vai começar em uma estação diferente e circular a partir daí. É uma proposta em que o ambiente é dividido em vários cantos, cada um preparado para uma prática diferente. Trata-se de uma releitura dos “cantinhos de aprendizagem” que já foram usados no passado.
13. STEM/STEAM: já se ouve falar com frequência dessas duas siglas que vêm do inglês e surgiram da preocupação dos professores americanos com o baixo aproveitamento dos alunos em matérias chamadas exatas e incluíram nos currículos programas para incentivar os alunos e aumentar o interesse por essas disciplinas – Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Em inglês, STEM: Science, Technology, Engeneering and Maths, Mas logo houve reação de muitos educadores, pais e empresários que apontaram que faltavam vários componentes importantes no movimento STEM. Componentes que ajudariam as crianças a se desenvolverem mais no presente e com a mesma rapidez se prepararem para o futuro. Surgiu então STEAM, uma abordagem que inclui Ciência (Science), Tecnhologia (Tecnhology), Engenharia(Engineering), Artes (the Arts – uma visão abrangente que inclui Linguagem, inclusive) e Matemática (Mathematics) como pontos de partida para estimular os estudantes a questionarem e pensarem criticamente.
Estamos, pois, diante de um cenário de transformações que privilegia a atividade dos alunos e obriga o professor a se atualizar permanentemente. Porque, de repente, transmitir dados fixos e engessados parou de fazer sentido. Afinal, o conteúdo se torna obsoleto rapidamente. Hoje, a maioria dos educadores concorda que a escola deve exercitar competências e habilidades que permitirão que os alunos analisem, decidam e atuem sob as mais variadas circunstâncias na vida.
Infelizmente a abordagem desse artigo não toca as escolas públicas do país, ainda às voltas com graves problemas como o de crianças que desmaiam de fome à porta da escola, falta de merenda, material básico, transporte para os alunos em determinadas regiões. Alguns professores da escola pública (ou talvez a maioria) são verdadeiros heróis e contam com a sua tenacidade e até mesmo coragem para seguirem dando aulas.