Bia Willcox
Como tudo o que se passa e se transforma nesse novo século, o ofício de ensinar está mudando a passos largos e só quem se aperceber disso conseguirá brilhar nas salas de aula de todos os jeitos e tamanhos.
O transmissor de conteúdos diversos mudou de nome tornando o professor, que se vê e age como tal, sujeito secundário no processo de aprendizagem.
Não é novidade que o professor hoje deve ir além do conteudismo tradicional sem se esquecer que sem conteúdo não somos ninguém (com exceção, claro, de alguns influencers, YouTubers e estrelas afins que duram um tempo limitado, brilhando sobre o vazio de conteúdos).
É fácil citar os papéis que o professor de hoje precisa exercer, mas já pensaram em listar os novos cenários que se apresentam a esse professor-século-21-que-tem-que-fazer-e-acontecer?
1- Conteúdos não são mais o suficiente. Há professores que dominam bem conteúdos, mas não superam a internet e suas inúmeras boas e confiáveis fontes. Tal qual acontece com os médicos, professores devem encarar a concorrência do Google.
2- Alunos hoje são conectados desde muito cedo. A luta do professor com os gadgets tecnológicos é inglória. Há os que acreditam que a solução é, em vez de proibi-los, inseri-los nas aulas. Mas, acreditem, não é uma inserção fácil: as redes sociais e os jogos continuam ali pra dispersar seres humanos que são os mesmos dispersivos desde sempre.
3- Dar aulas numa empresa em que o aluno é cliente e vê o que acontece a ele como um produto, podendo ele reclamar, criticar e exigir mudança como um patrocinador de programa na TV, é duro. Não tenho visão romântica da Educação e entendo que escola privada é empresa sim, mas, se esta não tiver convicção nem pé no chão, acaba cedendo às pressões do cliente e se comparando a um prestador de serviços qualquer. O professor fica então à mercê da satisfação do cliente e tem que adquirir os melhores cacoetes de vendedor e marketeiro. Cadê a autenticidade do processo educador, então? Professor bom passa a ser o avaliado com 5 estrelas, zerado no “Reclame Aqui” e seguido e curtido por alunos e ex-alunos. Estamos na era do professor-influencer.
4- Ser professor em tempos iluminados é muito mais fácil do que ser professor em tempos obscuros de “Black Mirror”, a série de TV britânica que mostra o efeito colateral nada bonito do mundo digital contemporâneo. Os tempos de linchamentos digitais, ódios e polarizações, covardias e retrocessos assombram qualquer professor mais profundo e de visão ampla. O desafio se torna maior, mas seus medos também. É natural.
5- O excesso de informações nos deixa a todos ansiosos, que dirá o professor. Se as pessoas em geral se sente ameaçada, sabendo cada vez menos em meio a tanta informação, imaginem quem tem que dominar com maestria conhecimentos que são bombardeados a todo o dia com novos artigos, informações, entrevistas, TEDs, Tumbirs e Pinterests. Tiro o meu chapéu para os professores de autoestima no lugar!
6- Hoje a escola tem funções originalmente atribuídas às famílias. Em suma: pais educam menos e escolas educam mais. Vide as modernas habilidades socioemocionais em voga que sempre existiram e que antes entendíamos que o aluno desenvolvia também em casa. Lembram do famoso “educação vem de casa”? Pois é.
7- Professor tem que se atualizar em tecnologias, sob pena de ser visto como obsoleto, por fora ou velho, digitalmente falando. Vida dura essa de ter tempo pra toda essa dedicação.
8- Alunos hoje podem virar haters, podem infringir leis, podem agredir, machucar, destruir. Claro que não podemos generalizar e ainda bem que esses casos são minoria e que fazer o bem prevalece, mas sabemos que ser professor hoje, dependendo de onde ele trabalhe, é profissão de risco.
9- Por fim, professores hoje ensinam e aprendem em meio à 4a Revolução Industrial, que vem como uma tsunami revolucionando o status quo. Eles devem preparar seus alunos pra profissões novas, outras que sequer existem e ter em mente uma verdade: muitas das profissões que vemos hoje sumirão do mapa nas próximas décadas.
Ainda assim, com tudo de novo e desconhecido, de desafiador, de difícil e de diferente, ainda está nas mãos do professor o principal (a cereja do bolo) no processo de aprendizagem e crescimento intelectual e emocional do aluno, aquilo que a Inteligência Artificial ainda não conseguiu reproduzir: a paixão por aprender que desperta no aluno a mesma vontade, que o motiva e faz a roda do conhecimento girar.
Ainda é do professor o tesão que faz os alunos terem vontade de contribuir para um mundo melhor. Não há máquina, aplicativo, e-board, messenger, RV, drone, touch screen ou canal de YouTube que, por si só, façam com que o aluno aprenda sem a preciosa interlocução de alguém como um professor. Quanto mais tecnologia aparecer, mais humanização e pessoalidade tornarão o aluno vinculado e afetado pelo processo de aprendizagem. Mesmo as comunidades globais que desenvolvem a colaboratividade e o espírito de equipe, vão precisar de alguém que “arrume a casa”, defina ritmos e regularidade de estudos, que discipline e medie as interlocuções e debates.
Ou seja, ainda não inventaram nada tão eficaz quanto um bom professor.
Que ele se transforme tanto quanto a sociedade e que continue assim, sendo essencial à Humanidade.
Bia Willcox é advogada, empresária, diretora do Grupo Wowl, professora, jornalista, produtora de conteúdos. Autodidata. Empreendedora.